domingo, 28 de junho de 2015

Ética na prática jornalística

Luiz Henrique Souza Campos, 49 anos, é editor do caderno Opinião do Jornal O Povo onde está há 18 anos. Em 1994 formou - se em Jornalismo na Universidade Federal do Ceará em seguida começou a trabalhar no Diário do Nordeste, lá passou pelas editorias de Política e Cidades. Em 1999 foi para o jornal O Povo na editoria de Cotidiano. Na época cobriu muito a área de polícia, pois ele fazia parte de um grupo de repórteres com esse perfil mais investigativo, fechando o time de repórteres, Demitri Túlio Claudio Ribeiro.  
Esse grupo de repórteres, mais tarde, formou a editoria de Grandes Reportagens que, na época, tinham tempo de trabalhar com notícias que demandavam mais investigação e consequentemente, mais tempo. Ficaram conhecidos por cobrir casos de grande repercussão, como: O escândalo do corpo de bombeiros; O caso do estupro de uma aluna na UNIFOR– Universidade de Fortaleza; O documento BR, que foi uma série de reportagens sobre a exploração de crianças e adolescentes nas BR’s do Ceara; o assalto ao Banco Central de Fortaleza; e o caso de repercussão internacional da morte dos cinco turistas portugueses na Praia do Futuro. Essas investigações renderam alguns prêmios de repercussão nacional, o que também trouxe credibilidade ao Jornal O Povo, como o Prêmio Esso, prêmio Embratel e a menção honrosa Vladimir Herzog. Há três anos passou a ser Editor da editoria de Opinião.  

“O jornal impresso vai se diferenciar do futuro em dois quesitos: As grandes reportagens, por oferecer material de profundidade; e a opinião, pela diversidade de dar espaço há vários pontos de vista.”        
O que é ética para você?  
Ética é ter o bom senso no seu dia a dia. Não é uma forma de bolo que você decora e que garante que você nunca sairá dos trilhos. A palavra não surgiu de agora, e em cada período se viveu uma época histórica diferente. A nossa visão de ética hoje é muito diferente da visão de ética de antigamente. Por exemplo, na época da escravidão, para a sociedade era normal ter escravos, escravidão é um absurdo hoje. Isso não era visto pela sociedade como um comportamento antiético. Tudo depende do seu referencial, o nosso mudou porque a nossa época histórica também mudou. Prefiro me basear na questão do bom senso, esses conceitos pré-estabelecidos de ética, a meu ver, mais prende do que liberta.
E sobre a questão ética no jornalismo e na editoria de opinião?  
Varia de acordo com a sua visão de mundo. Eu fui de um tempo em que você não fazia denuncia sem ouvir o outro lado, e hoje você não precisa mais ouvir o outro lado para denunciar alguma coisa, é normal publicar notícias em grandes veículos sem ouvir o outro lado da história. A televisão faz muito isso, se errar errou. Isso é ético? Eu acho que não, mas eles dizem que se não sair na imprensa, à justiça não condena. Nós como jornalistas, hoje, somos obrigados a fazer o que os outros estão fazendo se não ficamos para traz, isso é ético? É ético quando a Polícia Federal vai fazer uma apreensão as 5 da manhã e a imprensa já está toda articulada? Como esse pessoal da Operação Lava-Jato, vocês acham que esses acusados não serão condenados? Se não forem condenados pela justiça, eles já estão condenados pela mídia e consequentemente pela sociedade. Nesses casos a imprensa sempre está correta, mesmo sem saber o porquê da condenação. Isso nos deixa com o papel de julgar, e é essa a nossa função? Não é isso que nos é ensinado nas faculdades, nas disciplinas de ética.  É preciso que se respeite o princípio básico da dignidade humana. Quando eu estava na editoria de Grandes Reportagens eu fiz várias entrevistas com acusados que já estavam condenados pela sociedade e pela mídia. Quando entrevistei o Militão, o mentor dos assassinatos dos turistas portugueses na Praia do Futuro estava com o Demitri e nós queríamos entender e falar sobre aquela pessoa e não sobre o monstro assassino. Também entrevistei, junto com o Cláudio, aquele juiz que matou um vigilante dentro de um supermercado em Sobral, ele já estava condenado pela mídia e nós sabíamos tudo que tinha ocorrido, mas queríamos saber o outro lado da história, porque isso é jornalismo.

Esses casos tem grande repercussão midiática geralmente porque são crimes hediondos e geralmente está bem claro quem é o culpado. Você não acha que pode ser visto como se vocês, repórteres, estivessem defendendo o acusado?  
Não, nesses casos fizemos o que todo jornalista deve fazer, saber os dois lados da história. Ao escrevermos essas matérias sempre usávamos a visão jornalística, contando os fatos, e não uma visão humanista. Queríamos entender o porquê do acontecido para traduzir ao leitor. Se isso fosse hoje nós seriamos acusados de estar defendendo um monstro, isso é o que me preocupa no futuro do jornalismo. 

O fato do jornalista às vezes se comportar como um juiz remete muito a espetacularização da notícia, desses programas policiais e de como isso vende. Qual o papel do jornalista nesse momento?  
O jornalista está sendo obrigado a espetacularizar a notícia. Fica difícil até saber onde está o limite entre jornalista e ator. Como você disse, é o que vende. Se eu não ajudar o meu jornal a vender, ele quebra. Enquanto deixo de publicar alguma coisa porque não consegui informações suficientes, como por exemplo, ouvir o outro lado, o meu concorrente vai publicar sem ouvir e aí? Então é difícil lidar com isso.

Você trabalhou muito tempo com investigação. Qual a sua opinião sobre o Jornalismo Investigativo, as câmeras escondidas, os microfones e as escutas telefônicas?  
Hoje não existe mais jornalismo investigativo, hoje existe jornalismo fitista. Tudo é escuta. Só pra esclarecer, escuta só pode ser feito sob autorização judicial e para determinada pessoa e para determinado assunto. Quando a polícia requer uma investigação dessa é para fazer parte de um processo, que é ou teria que ser sigiloso.

E como o jornalista tem esse furo?  
Pronto, uma questão ética. O jornalista tem interesse em publicar e usam, sempre, a premissa de que o que está sendo veiculado é para informar a sociedade, porque caso o contrário os responsáveis, usando como exemplo os casos de corrupção e crimes hediondos, não serão julgados e sairão impunes. Assim é feito muita coisa antiética mas que é visto com bons olhos pela sociedade. De certa forma a sociedade, ao aceitar esse tipo de comportamento, incentiva o jornalista a ser antiético.

Como falar sobre ética hoje no jornalismo?  
É como eu já falei, vai do bom senso de cada um, não apenas do jornalista, também do veículo que ele trabalha.

Já que o assunto é a Ética, qual a sua opinião sobre o Código de Ética dos Jornalistas?  
O Código de Ética é tão atrasado! Bom, o jornalista faz parte de um campo na sociedade que é o corporativismo. Toda categoria é corporativista. Então por mais que um jornalista cometa um erro, os outros vão sempre proteger lo. Instinto de sobrevivência. Até porque, a linha ética no nosso meio é tão tênue, que nunca se sabe quando o errado será você. Mas pra finalizar, nenhum código de ética é seguido por nenhuma categoria.

Para encerrar, você acha que os jornalistas hoje tem muita liberdade?  
Não tem resposta, porque nós jornalistas precisamos disso. Quando trabalhamos nas Reportagens Especiais, tínhamos muitos furos, muitos meios de conseguir. Às vezes, eu lembro, que o Diário ficava doido querendo saber como nós tínhamos conseguido tal “furo” e eles não. Não fomos antiéticos, fomos persistentes! Alimentamos as fontes, tivemos sorte e também ajuda muito quando o jornalista tem experiência. Para ser um bom jornalista hoje é preciso três coisas: Um texto razoável, persistência e sorte, não é qualquer um que tem a sorte de estar no momento certo na hora certa.

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